segunda-feira, 13 de setembro de 2010

               Abri a porta e lá estão eles, trepando como dois cães no cio. Não percebem minha presença, nem a de todos meus convidados atrás de mim. Estão de costas, aproveitando aquele momento sublime deles. Não dá nem dez segundos e ele goza, e na cara dela. Deviam estar fazendo isto já faz um tempo, ou deram um novo entendimento, mais ao pé da letra, do termo “rapidinha”. Cretina!
Nunca me deixou gozar na cara dela e agora aqui está, trepando com meu suposto amigo, em mimha primeira vernisage com meu nome exposto. Tantas fotos que fiz pensando nela, muitas até expostas ali, acreditando que nela eu tinha o amor que sempre procurei. Talvez até tivesse mesmo, mas não era recíproco, pois se ela me amasse, mesmo morrendo de tesão por outro homem, não agia desta forma...humilhante! Todos meus convidados ficam quietos. Alguns horrorizados, outros adorando a cena. Estes deveriam já pensar nas manchetes das colunas sociais. Depois que ele acabou de gozar na cara da minha noiva, ela dá uma última chupadinha, aquela para limpar o pau do cara, sabe? Enquanto faz isso, finalmente percebe que estou vendo tudo, e não sozinho. Ela se assusta, até morde o pau do maldito. Ele o tira rapinho, cheio de dores e, ao olhar para trás, também percebe a situação posta por eles. Ficam perplexos com a situação, e eu, que fui humilhado, pisado, enganado e cuspido, um cuspe que, aliás, está cheio de porra alheia, me ponho inexpressivo. Sabe aquele vazio que dá quando nos encontramos em situações nas quais parece que perdemos o chão? Então, é assim que me sinto, sem chão, sem pulso, sem ser o que um dia fui. Pois este que um dia fui, hoje se escondeu no mais profundo e remoto espaço dentro de mim. Qual? Sei lá, mas lá está ele, envergonhado e com seu orgulho roubado por aqueles dois cretinos. Um macho destituído de seu orgulho é como um pavão destituído de suas penas. E como um pavão de penas abertas e peito estufado, eu era imbatível em minhas conquistas. Era lindo de se ver. Agora, só me restou uma personagem esvaziada de alegrias, de amor, de ternura e, também, coragem.
               Olho pro lado e vejo uma máscara, toda branca e sem traços de expressão, nem forma reconhecível de um rosto. Apenas um objeto todo branco e todo liso, sem relevos, nem entradas, a não ser os dois buracos para os olhos e mais dois para o nariz. Uma linda obra, por sinal. Grande é esta artista que, junto a mim, apresenta suas obras nesta vernisage coletiva e que, agora, junto a mim, vê minha noiva com a cara cheia de porra daquele que, um dia, se disse meu amigo. Com a maior leveza e calma do mundo pego esta máscara. A ponho e meu rosto, delicadamente e, assim, me ponho como deveria. Escondido por detrás de um objeto inanimado, inexpressivo e uniforme. É assim que me sinto e, daqui em diante, é assim que me apresentarei. Até me tornar aquele homem confiante, forte e amável de novo, serei esta máscara covarde, fraca e indiferente. Saio da galeria em passos curtos, emanando uma imensa calma. Também, como poderia rugir, gritar e chingar aqueles cretinos? Tudo me foi tirado naquele momento, inclusive minhas emoções mais intensas. Enquanto saio calmamente, pego uma xícara de café que é oferecida a todos na saída, sem para por nenhum instante. A mulher contratada para oferecer o café fica imóvel, sem saber como agir. Apenas me olha de canto de olho, como se estivesse envergonhada por mim. Quando vou beber, a xícara bate na máscara, ou melhor, em meu rosto, e sou obrigado a elevá-lo por alguns instantes, revelando uma falsa imagem do que um dia fui. Enquanto ando, bebo do café e ele não tem sabo algum. Estava quente, muito quente, mas nem quando queimo minha boca, minhas emoções se afloram. Apenas largo a xícara em meu caminho e ela se estilhaça ao chão. Continuo seguindo meu rumo e deixo todos para trás. O que será da vernisage? Sei lá, mas espero que os outros artistas consigam reverter o atual clima que instaurou-se na galeria, pois eles, assim como o que fui, merecem ter esta noite como o auge de suas glórias. Se não posso mais gozar deste prazer, que pelo menos eles o façam. Quem sabe eles não conseguem distorcer os fatos, afim de fazer aquela situação tornar-se parte do show? Uma performance ousada, por assim dizer? Afinal é exatamente isso o que nós artistas fazemos, não? Distorcemos os fatos ao nosso agrado, afim de revelar o mundo como nós o vemos. As nossas verdades. Não?
               Não sei mais o que sou...

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